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Folheto #20: Foi pausa, foi rito, foi indizível

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Dr. Italo Marsili
jul 14, 2025
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Folheto #20: Foi pausa, foi rito, foi indizível
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Folheto #20

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Foi pausa, foi rito, foi indizível

Passo pouco tempo nas redes sociais. Bem menos do que alguns poderiam supor. Não por virtude, mas por falta de tempo, mesmo. Não sei quem são os comentaristas do momento, confundo o nome de políticos com o de ex-alunos. Realmente não tenho muita vocação para valete de chambre digital. Atenção, nunca fui a um podcast (na verdade, fui a um: dois amigos queridos, vizinhos, iniciavam um empreendimento e me chamaram. Fui. Hoje são um sucesso). Não tenho paciência, confesso. Confesso, ainda, uma outra coisa (objeto desta digressão em forma de texto): tenho sentido náuseas ultimamente. Com mais frequência do que o de costume. Um Vonau sublingual ao dia, pela manhã. Acompanhando a tapioca de frango desfiado que a Renata me prepara com carinho. Um Vonau 8 mg, sem prescrição médica. Fiz uma pequena busca no google: duzentos reais a caixa com 30 comprimidos. Um mês de Vonau. Duzentos reais. Vale a pena. Desculpem, voltemos ao assunto do enjoo: textos produzidos com chat GPT. São muito cafonas, muito. São cafonérrimos. Eu tentei, quem trabalha comigo é testemunha de que eu recebi com entusiasmo o advento de uma maquininha capaz de conversar conosco, como se fosse um humanozinho, usando algo tão raro que não me importava ser artificial, a inteligência.

Comecei. Fiz um cadastro em 2023. Entusiasmado, explorei as possibilidades. Li artigos em inglês, mantive contato com engenheiros e desenvolvedores. Na minha faculdade (sim, eu sou dono de uma faculdade) oferecemos um curso sobre Inteligência Artificial, muito bom por sinal. Tudo. Fiz de tudo, juro.

A esta altura, o leitor pode notar a minha decepção, o cansaço, a descrença, o sangue de quem apanhou e perdeu. Este sou eu. Quero ser pedante agora: não fui vencido pela idade (pelo choque geracional), mas por ter senso estético; e não há nada mais antiestético do que um texto produzido por GPT. Não importa o prompt oferecido, não importa o operador, o GPT tem, nos últimos meses, vestido um casaquinho escroto, com pantufinhas escrotas nos pés e um bigodinho escroto na cara, e um desodorante que não é desodorante mas leite-de-não-sei-o-que-natural no sovaco, e todo esse pacote de coisas sem lastro, cultura, densidade... uma tragédia. Sabe qual a maior tragédia? Rolar o feed do Instagram e perceber duas coisas: 99% dos textos escritos, têm sido escritos com GPT. Isto é triste mas não é uma tragédia. A Tragédia vem a seguir: os comentários. “nossa, você tirou as palavras da minha boca”; “impressionante! Você lê pensamento”; “fiquei emocionda”... incultura geral. Morte do senso estético. Você não é capaz de ouvir a voz de uma máquina e discernir que aquelas palavrinhas têm som de robô? A cambada digital não tem aquele mínimo de cultura para distinguir a voz humana.

Uma ex-paciente me escreveu um texto por whatsapp há uns dias. Um aluno me escreveu um convite. (tudo isto é verdade). O que essas mensagens tinham em comum? Aquela estrutura de fezes: “não é sobre A, mas sobre B”; “não é nem A nem B, mas C”; “o que antes era [algum verbo vazio]; agora é símbolo, é [outro verbo vazio em antítese ao primeiro], é silêncio”. Sempre uma ou mais teses rasteiras, que parecem início de insight: “Não é A”, seguidas por uma Antítese sentimental-pseudofilosófica, com um termo ambíguo e pretensamente poético: “É B”; chegando a uma “Síntese vazia ou silêncio performático” (essa é a parte do Vonau, muito enjoada), como se o texto tivesse atingido um plano superior de consciência: o "C" transcendental: “é pausa”, “é rito”, “é o indizível”.

Fui colhendo ao acaso, sobretudo no Instagram de gente bacana, de professores bacanas, alguns exemplos desta matéria fecal do espírito digital:

"Não é sobre A, é sobre B" (o falso insight) “Não é sobre vencer, é sobre seguir mesmo com medo”

"Não é nem A, nem B, é C" (a falácia do terceiro estado) “Não é nem amor nem ódio. É memória”; “Não é nem partida nem chegada. É travessia”.

"Antes era X; agora é Y, é silêncio" (a trilogia da epifania de fezes) “O que antes era espera, agora é entrega. É dança. É fé.”

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